Como diminuir a desigualdade de gênero e fazer crescer a economia mundial

Imagem: AsianDream/iStock by Getty Images

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8 de setembro de 2022

Tirar partido da equidade econômica das mulheres.

Demasiadas mulheres não têm acesso a oportunidades econômicas, uma situação que, além de ser injusta, prejudica o crescimento e a resiliência de todos. Sabemos que em países com maior desigualdade de gênero, uma redução da disparidade de participação entre homens e mulheres na força de trabalho poderia traduzir-se num aumento médio do produto econômico de 35%. O progresso, no entanto, demora a chegar e os choques, como os desastres sanitários e climáticos, a agitação social e a guerra continuam a agravar a desigualdade de gênero, afetando diretamente a vida e o meio de subsistência das mulheres ou mantendo-as afastadas do sistema de ensino e do mercado de trabalho.

A adoção de políticas econômicas e financeiras adequadas pode ajudar a mudar esses resultados negativos, melhorando as economias ao apoiar a recuperação e criando resiliência a choques futuros. Em outras palavras, todos nós beneficiaríamos do sucesso das mulheres. Por exemplo, apesar de a pandemia ter feito recuar os progressos alcançados pelas mulheres em todo o mundo, também impulsionou inovações em matéria de políticas. Vários programas de assistência extraordinária criados no âmbito da pandemia visaram as mulheres e permitiram alargar o número de pessoas cobertas pelas redes de proteção social. Esse tipo de iniciativas permite orientar a assistência prestada para fazer face aos atuais picos dos preços dos alimentos e combustíveis.

Para as autoridades públicas, existem soluções bem comprovadas para adotar ações macroeconômicas sensíveis às questões de gênero.

Em primeiro lugar, é necessário aumentar o investimento no capital humano das mulheres. Os ganhos decorrentes do acesso igualitário das mulheres a alimentação, saúde e educação são especialmente grandes nas economias de mercados emergentes e em desenvolvimento. É o caso, por exemplo, das transferências de renda que ajudam as famílias a pagar bens essenciais em países onde a rede de proteção social é menos desenvolvida.

No início da pandemia, o Brasil adotou o Auxílio Emergencial, um programa de transferência de renda que concedeu o dobro dos benefícios às famílias lideradas por mulheres. As estimativas do corpo técnico do FMI mostram que a taxa de pobreza entre essas famílias teria aumentado de 11% para mais de 30% sem o Auxílio Emergencial; em vez disso, caiu temporariamente para cerca de 8%. Recentemente, o Egito ampliou a assistência em dinheiro para mães solteiras de baixa renda, ajudando-as a manter os filhos na escola e a cuidar da saúde deles. No Togo, a tecnologia móvel ajudou a agilizar a assistência financeira de emergência durante a pandemia, beneficiando, em especial, as mulheres.

A segunda solução testada e aprovada é permitir às mulheres que trabalhem fora de casa ou criem o seu próprio negócio. A aplicação de reformas tributárias, dos gastos públicos, da infraestrutura financeira e regulamentos, assim como dos mercados de trabalho também pode revelar-se útil. Oferecer acesso a creches de qualidade e a um custo acessível libera mais mulheres para trabalhar, além de gerar emprego diretamente.

Na Noruega, a implementação do acesso universal a creches aumentou a probabilidade de emprego das mães em 32 pontos percentuais. Nas economias de mercados emergentes e em desenvolvimento, o acesso a telefones celulares e à Internet abre as portas para oportunidades econômicas. Por exemplo, um estudo do FMI mostra que as finanças tradicionais e digitais estão ajudando a reduzir a diferença de gênero no acesso a serviços financeiros, como o microcrédito, o que resulta numa diminuição das desigualdades e num crescimento mais elevado.

O terceiro aspeto que deve ser abordado é o dos vieses. Dos 190 países inquiridos, o Banco Mundial constatou que as mulheres só dispunham dos mesmos direitos que os homens em 12 deles. A discriminação baseada no gênero nas instituições sociais custa à economia mundial US$ 6 trilhões, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.. Contudo, nos últimos anos, os países reduziram esses custos por meio de ações sociais e legais, como a repressão ao casamento de menores, a criminalização da violência doméstica e o aumento do número de mulheres em cargos eletivos.

Por último, também é imprescindível aumentar a representação das mulheres em posições de liderança. Uma análise do FMI mostra que uma maior presença de mulheres nas instituições financeiras e na formulação de políticas financeiras está intrinsecamente ligada a um aumento da resiliência financeira. Além disso, nas empresas da fintech e do setor corporativo, foi estabelecida uma correlação entre o número superior de mulheres em cargos de liderança e o maior desempenho e rentabilidade registrados nos respetivos setores.

A estratégia de gênero do FMI

O FMI tem apoiado os países membros na implementação e melhoria das políticas de gênero há já vários anos. E, recentemente, a nossa Diretoria Executiva aprovou a primeira Estratégia completa do FMI para a incorporação da perspectiva do gênero para ajudar os países membros a adaptar, de acordo com o seu contexto específico, políticas favoráveis à igualdade de gênero.

A estratégia reconhece que as políticas macroeconômicas e financeiras afetam homens e mulheres de forma diferente e muitas vezes de forma não intencional. Estamos ajudando as autoridades a identificar e corrigir esses vieses ao aplicar uma perspectiva de gênero nas nossas principais atividades – desde a supervisão periódica das políticas de cada país membro, passando pela forma como projetamos e implementamos os programas, até aos serviços de desenvolvimento de capacidades que prestamos.

Temos apoiado o aumento dos gastos destinados às mulheres nos países aos quais concedemos empréstimos. Por exemplo, o Egito aumentou a disponibilidade de estabelecimentos que oferecem serviços educativos de nível pré-escolar e melhorou a segurança do transporte público no âmbito de um programa apoiado pelo FMI, facilitando a deslocação das mulheres ao local de trabalho. São Tomé e Príncipe, por sua vez, lançou uma iniciativa apoiada por um programa do FMI sobre orçamento de gênero, com o uso de políticas e instituições fiscais para promover a igualdade das mulheres em todos os programas do governo. Também quantificamos os benefícios em termos de produtividade de matricular mais meninas no ensino médio no Senegal e em outros países.

No âmbito dessa nova estratégia, o Fundo trabalhará nos próximos anos com nossos 190 países membros, bem como com os parceiros externos, para aumentar a amplitude das suas recomendações de políticas e conferir mais rigor às suas análises para ajudar um maior número de países a adaptar e implementar políticas que apoiam a igualdade de gênero.

Com o passar do tempo, políticas macroeconômicas e financeiras sensíveis às questões de gênero resultarão em mais crescimento, mais estabilidade e resiliência econômica, e menos desigualdade de renda – algo benéfico não só para as mulheres, mas para todos.

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Kristalina Georgieva (biografia no link)

Antoinette Monsio Sayeh é Subdiretora-Geral do FMI e professora visitante honorária do Centro para o Desenvolvimento Global (CGD) desde novembro de 2016. Como Diretora do Departamento da África do FMI entre 2008 e 2016, supervisionou e reforçou consideravelmente as relações da instituição com seus países membros da África Subsaariana. No período de 2006–2008, foi Ministra das Finanças da Libéria. Anteriormente, trabalhou no Banco Mundial por 17 anos. Antes de ingressar no Banco Mundial, ocupou cargos consultivos na área econômica dos ministérios das Finanças e do Planejamento da Libéria. Graduou-se com honra em Economia pelo Swarthmore College e doutorou-se em Relações Econômicas Internacionais pela Fletcher School da Tufts University.

Ratna Sahay é a Assessora Principal sobre Questões de Género no Gabinete da Diretora-Geral do FMI. Anteriormente, trabalhou nos Departamentos da Ásia, da Europa, do Oriente Médio, do Hemisfério Ocidental, Financeiro, de Mercados Monetários e de Capitais, e de Estudos do FMI, tendo liderado importantes projetos analíticos e sobre políticas, além de haver chefiado várias missões a países de mercados emergentes e de baixa renda. Escreveu inúmeros artigos em importantes publicações sobre inflação, crescimento econômico, política monetária, desenvolvimento do setor financeiro, repercussões do mercado financeiro, crises financeiras, inclusão financeira, macroeconomia e gênero, política fiscal, sustentabilidade da dívida, fluxos e controles de capital e economias em transição. Lecionou em instituições como a Universidade de Délhi, a Universidade de Columbia e a Universidade de Nova York. É doutora em Economia pela Universidade de Nova York.