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Sem financiamento suficiente, as melhores intenções da comunidade global manifestas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) permanecerão inalcançáveis.
Por isso, em vista dos recentes recuos no financiamento para o desenvolvimento, as autoridades deveriam voltar a atenção para a necessidade de adotar estratégias nacionais decisivas para que essas melhores intenções possam ser transformadas em realidade. Seria possível canalizar os recursos necessários por meio de uma combinação de medidas para mobilizar receitas, atrair financiamento privado e apoiar o desenvolvimento do setor financeiro. As autoridades precisarão se envolver em ações coletivas e praticar um “novo multilateralismo” em apoio à consecução dos objetivos mundiais.
Um novo estudo da ONU , elaborado com a colaboração significativa do FMI, Grupo Banco Mundial, Organização Mundial do Comércio, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e outras agências da ONU, faz uma profunda análise de como os países e a comunidade internacional estão se saindo na mobilização do financiamento necessário.
As necessidades de financiamento não são pequenas. No início deste ano, um estudo do FMI estimou em US$ 2,6 trilhões as necessidades adicionais de gastos por ano até 2030 para que os mercados emergentes e de baixa renda ofereçam às populações cada vez maiores educação, saúde, energia, estradas, água e saneamento no âmbito dos ODS mais importantes. O desafio do financiamento é particularmente grande nos Estados frágeis e de baixa renda, pois partem de uma situação inicial precária, sua população cresce rapidamente e, na maioria dos casos, sua trajetória de baixo crescimento responde por um quinto do total das necessidades de financiamento.
O relatório da ONU também destaca que alguns desdobramentos recentes podem dificultar a mobilização de recursos: o crescimento mundial provavelmente atingiu seu pico; as restrições comerciais estão se intensificando; alguns mercados emergentes estão experimentando reversões dos fluxos de capitais; e os riscos de endividamento estão crescendo, com cerca de 30 países de baixa renda em alto risco de superendividamento ou já superendividados (ver também o blog A dívida como obstáculo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ). Estamos, de fato, em “ um momento delicado ” para a economia mundial, como observou a Diretora-Geral do FMI no início deste mês.
Enfrentar o desafio do financiamento
O relatório sobre o financiamento para o desenvolvimento sustentável contém mais de 40 recomendações específicas aos Estados membros da ONU para melhor alinhar os recursos com os investimentos nos ODS. Quatro propostas merecem atenção especial:
● Desenvolver um quadro de financiamento. O financiamento costuma ser a parte mais fraca dos planos nacionais referentes aos ODS: um estudo recente mostrou que mais de três quartos dos 107 planos nacionais não contêm detalhes sobre os custos ou sobre o financiamento. O relatório faz recomendações concretas sobre como operacionalizar um quadro de financiamento e ilustra como alguns países formularam planos que identificam os fluxos públicos e privados.
● Formular estratégias de arrecadação de médio prazo. O relatório recomenda forjar um consenso nacional em torno das estratégias de arrecadação de médio prazo que possam apoiar as reformas durante o ciclo político, destacando o vínculo entre o aumento das receitas e os serviços públicos eficazes e equitativos. A Indonésia oferece um bom exemplo de uma estratégia ambiciosa, que visa aumentar a receita de 10% para 15% do PIB no médio prazo (conforme explicado neste livro do FMI ). As estratégias de arrecadação podem ser reforçadas pela coordenação, em nível mundial, de uma reforma da tributação das empresas internacionais.
● Tomar medidas para apoiar a sustentabilidade da dívida. Uma discussão aprofundada dos riscos da dívida oferece um variado leque de medidas para ajudar os países a identificar as vulnerabilidades logo no início e administrar melhor sua dívida. O relatório destaca que cada situação de crise da dívida é diferente e discute os esforços e desafios atuais para reestruturar a dívida na Gâmbia, na República do Congo e em Moçambique.
● Preparar-se para futuras crises. Mesmo os planos, estratégias e ferramentas mais bem elaborados podem não preparar devidamente os países em desenvolvimento para as futuras crises financeiras nem para as repercussões de problemas nas economias avançadas. O relatório reitera a importância de assegurar que a rede de proteção financeira mundial seja adequada e abrangente, o que passa pela atual revisão das modalidades de financiamento do FMI (a XV revisão das cotas).
Embora sejam grandes, os desafios financeiros na maioria dos países não chegam a ser avassaladores. Serão necessários esforços especialmente intensos para alterar os indicadores na África e em partes do Oriente Médio, com políticas nacionais para apoiar os investimentos nos ODS, além de cooperação internacional para encontrar soluções para desafios novos e emergentes. O relatório sobre o financiamento para o desenvolvimento sustentável dá uma importante contribuição para identificar as medidas necessárias.
Christopher Lane (clane@imf.org) é Representante Especial do FMI na ONU. Sua carreira no FMI concentra-se nas áreas de política macroeconômica e desenvolvimento econômico em mercados emergentes e em desenvolvimento. Antes de assumir o posto na ONU, foi responsável pelas operações e políticas em cerca de 70 países em desenvolvimento de baixa renda entre 2012 e 2016, abrangendo iniciativas de política para fornecer alívio da dívida a países que enfrentavam crises de saúde pública (como o ebola) e para fortalecer as redes de segurança financeira de países em desenvolvimento. Trabalhou também em questões ligadas às políticas e operações de Libéria, Mali, Rússia, Turquia, Lituânia e Nigéria.