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Mudanças climáticas na América Latina e Caribe: Desafios e oportunidades

Anna Ivanova, Julie Kozack, Sònia Muñoz e Jorge Roldós
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Temperaturas mais altas, eventos climáticos extremos e a dependência de setores sensíveis ao clima, como o turismo e a agricultura, são apenas alguns dos desafios enfrentados pela América Latina e Caribe (ALC). Numa região tão diversa, as mudanças climáticas produzem diferentes impactos nos países e impõem um conjunto de desafios tão variados quanto os próprios países.

Mas as mudanças climáticas também oferecem oportunidades. A transição climática poderia ajudar a impulsionar o crescimento, gerar novos empregos e, em paralelo, apoiar a recuperação após a pandemia e melhorar os resultados em termos de saúde. A transição será facilitada em alguns países da ALC por suas riquezas naturais: metais “verdes” como cobre, níquel, cobalto e lítio.

Na mais recente edição do relatório Perspectivas Econômicas Regionais: América Latina e Caribe, exploramos as opções de política disponíveis para maximizar essas oportunidades. A combinação de políticas mais eficaz dependerá dos desafios e circunstâncias de cada país.

Opções de política para a mitigação climática

As emissões líquidas de gases do efeito estufa (GEE) na região são compatíveis com o tamanho da economia e da população – cerca de 8% do total mundial. Contudo, a composição das emissões na ALC é muito diferente da de outras regiões.

O setor energético contribui bem menos para o total de emissões na ALC (43%) do que a média mundial (74%). Por outro lado, a agricultura contribui com 25%, em comparação com uma média mundial de 13%. O uso da terra, a mudança no uso da terra e a silvicultura (UTMUTS) contribuem 19% – bem acima da média mundial de pouco mais de 1%.

Uma pegada de carbono distinta

Dada a grande participação nas emissões na categoria UTMUTS, bem como seus numerosos ecossistemas e espécies únicos, a região tem potencial para reduzir as emissões líquidas, com boa relação custo-benefício. De fato, simulações com modelos em Huppmann et al. sugerem que pode ser mais econômico para o mundo compensar os países da ALC pela proteção, gestão e restauração de ecossistemas do que dedicar um volume igual de recursos para aumentar os esforços de mitigação em outros lugares.

As autoridades da região precisarão adotar uma abordagem multifacetada para atingir suas metas de mitigação das mudanças climáticas, com o intuito de aumentar a eficiência energética e o uso de energia renovável, reduzir as emissões nos transportes e na agricultura e restaurar e proteger as florestas (que funcionam como sumidouros naturais de carbono).

Entre as ferramentas de política para atingir essas metas figuram i) medidas de mitigação baseadas no preço, como a redução dos subsídios aos combustíveis fósseis, a introdução de impostos sobre o carbono, o estabelecimento de sistemas de comércio de emissões ou o desenvolvimento de um sistema de feebates; e ii) medidas de mitigação que não são baseadas no preço, como o investimento público em tecnologias e infraestrutura de baixo carbono, incentivos fiscais e regulamentação favorável à mitigação.

A eliminação gradual dos subsídios à energia e a instituição de impostos universais sobre o carbono de até US$ 75 por tonelada poderiam ajudar alguns países da ALC a alcançar suas metas do Acordo de Paris de 2016. As receitas geradas por essas políticas variam de 0,5% a 4,5% do PIB e poderiam ser usadas para compensar as famílias vulneráveis pela elevação dos preços do carbono. De facto, a nossa análise indica que transferências de renda universais podem neutralizar integralmente o impacto negativo sobre os primeiros seis a sete decis do consumo per capita das famílias na Argentina, Brasil, Colômbia e México.

Fechar a brecha das emissões

Reforçar a adaptação

Os desastres relacionados ao clima podem custar bilhões. A redução dos custos econômicos exigirá investimentos substanciais no aumento da resiliência, sobretudo na infraestrutura.

Estimamos que investir em resiliência estrutural pode aumentar o nível do PIB a longo prazo entre 2% e 6% no caso das ilhas do Caribe e entre 0,2% e 1,4% no caso dos países da América Central. Além disso, o nível do produto seria cerca de 0,25% mais alto três anos após um desastre natural no Caribe, em média, e cerca de 0,1% mais alto na América Central, uma vez alcançada a resiliência. Após três anos, o nível da dívida pública seria 0,75 ponto percentual inferior no Caribe e cerca de 0,25 ponto percentual menor na América Central.

Os dividendos da resiliência estrutural

Mas como o aumento da resiliência estrutural leva tempo, os países talvez também precisem aumentar a resiliência financeira por meio da cobertura de seguro.

Estimamos que uma cobertura de seguro de 15% a 30% do PIB nos países do Caribe e 10% a 20% na América Central, Panamá e República Dominicana poderia cobrir 99% dos custos fiscais relacionados aos desastres naturais. Esse cálculo se baseia em uma estrutura de seguro que abrange a construção de um fundo de poupança preventiva do governo, acesso ao Mecanismo de Seguro de Risco para Catástrofes no Caribe (CCRIF) e a emissão de títulos contingentes do Estado. Isso poderia custar aos países entre 0,5% e 2% do PIB por ano.

A função do seguro

Os países precisarão encontrar soluções inovadoras para financiar os custos iniciais da resiliência. Contribuições mais significativas do setor privado para o investimento em adaptação poderiam ajudar e podem ser facilitadas por políticas para melhorar o acesso aos serviços financeiros e a resiliência ao risco climático por parte dos sistemas financeiros nacionais.

O custo

Atingir as metas da mitigação e adaptação climática dos países da ALC custará cerca de US$ 90 bilhões a US$ 110 bilhões por ano para toda a região. Essas estimativas estão sujeitas a um elevado grau de incerteza. Entretanto, como a maioria dos países não conseguirá cobrir esses custos, será essencial obter financiamento externo – tanto do setor oficial quanto do setor privado.

Do lado do setor privado, os mercados de dívida e de ações ligados à sustentabilidade têm potencial para apoiar os esforços de mitigação e adaptação climática, mas é necessário tomar medidas para evitar a chamada “maquiagem verde”. Instrumentos contingentes do Estado, como títulos ligados a desastres ou os swaps de dívida por natureza, também poderiam ser úteis. Contudo, o financiamento do setor privado não será suficiente e o apoio bilateral e multilateral – em condições concessionais e sob a forma de doações para os países mais vulneráveis – será crucial.

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Anna Ivanova é Subchefe da Divisão de Estudos Regionais do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI. Anteriormente, foi chefe de missão para o Equador, tendo também sido economista sênior do Grupo de Análise das Perspectivas de Crescimento do Banco Mundial, liderando missões para a Guatemala e trabalhando com outros países, como Costa Rica, Alemanha, Holanda, Iêmen e Egito. Seus estudos abordam temas como políticas fiscal e do setor financeiro, inclusão e desenvolvimento financeiros, o papel das instituições financeiras internacionais e o crescimento. Antes de sua carreira como economista, trabalhou como física no Instituto para Problemas Nucleares da Bielorrússia. Doutorou-se em economia pela Universidade de Wisconsin-Madison, com mestrados em Desenvolvimento Econômico, pela Universidade Vanderbilt, e em Física Nuclear, pela Universidade Estatal da Bielorrússia.

Julie Kozack é Subdiretora do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, onde lidera o trabalho do FMI com a Argentina. Anteriormente, foi Subdiretora do Departamento Europeu do FMI, onde supervisionou as análises sobre uma série de países, como Ucrânia, Suécia e Polônia. Foi também chefe de missão do FMI para a Alemanha (até agosto de 2019) e Diretora do Instituto Regional de Formação FMI‑Singapura (STI) – o centro regional de formação do FMI para a Ásia e o Pacífico – de outubro de 2014 a agosto de 2017. Em mais de 20 anos no FMI, Julie Kozack exerceu diversas posições de liderança. Doutorou-se em Economia pela Universidade de Columbia.

Sònia Muñoz é Chefe da Divisão do Caribe I e chefe da missão consultiva regional para a União Monetária do Caribe Oriental no Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI. Anteriormente, foi Subchefe de Divisão no Departamento de Mercados Monetários e de Capitais, onde foi chefe de missão do Programa de Avaliação do Setor Financeiro para Belarus e Bósnia-Herzegovina, e subchefe de missão para Japão, Argentina e Cazaquistão. Em mais de 18 anos no FMI, também trabalhou em missões de supervisão e programas nos Departamentos da Europa, Ásia, África e de Finanças Públicas. Suas pesquisas e publicações abarcam temas como as repercussões das políticas macroprudenciais, as interconexões financeiras, as metas de inflação, as alocações de carteira, a competitividade, o crescimento em favor dos pobres, a integração regional e as reformas tributárias, entre outros. Doutorou-se em Economia pela London School of Economics.

Jorge Roldós é Diretor Adjunto do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI. Nos últimos 20 anos, analisou exaustivamente questões macroeconômicas na América Latina e em outras regiões, e já publicou uma série de estudos sobre macroeconomia em economias abertas, política monetária, bancos e mercados financeiros.